quinta-feira, 28 de março de 2013

Capítulo 1 - Um Lugar Estranho Com Pessoas Acolhedoras (Cont.)

Depois de muita conversa, bernardo disse que se sentia cansado, então foi para o seu quarto dormir. Permaneci algum tempo conversando com Luíz e Henrique sobre muitas coisas, principalmente sobre a história de namoro dos dois, visto que gostei muito deles enquanto um casal.
Após algum tempo, Henrique se levantou e se direcionou para a porta, pois estava ficando tarde e precisava ir para casa. Depois de se despedir de Henrique, Luíz voltou ao seu lugar no outro sofá, então continuamos conversando.

- Vocês formam um belo casal Luíz!
- Obrigado Felipe! Por falar nisso, eu quero te perguntar algo.
- Pode perguntar. Qual o assunto?
- Bom, você sabe que o meu irmão está solteiro, e como me dissestes que também estás...
- Ainda não entendi, continua.
- Tudo bem, vou ser bastante direto. O Bernardo está solteiro há muito tempo, porque da ultima vez que ele se envolveu emocionalmente com alguém, ele sofreu uma grave desilusão. Então, posso estar me precipitando, mas acho que ele gosta de você.
- Luíz, eu não percebi nada. Acho que podes estar enganado!
- Felipe, eu não estou te mandando fazer nada, só queria que soubesses disso. Afinal, apesar do pouquíssimo tempo que estás conosco, senti que és uma pessoa de bom coração, e poderias fazer muito bem ao meu irmão. Quero te perguntar somente mais uma coisa: Já parou pra observá-lo atentamente?
- Na verdade não. Muitos pensamentos me vêm à cabeça nesse período desde que cheguei aqui, então eu não parei pra observá-lo, apesar de ter percebido quão gentil ele é.
- Está ficando tarde. Eu não vou mais te importunar com isso. Como eu disse, só queria que soubesses disso, afinal quero somente o bem do meu irmão. Então, tenha uma boa noite e reflita sobre o que eu te disse.
- Boa noite Luíz!

A conversa com Luíz, de uma maneira muito singela, desvelou um véu que insistia em cobrir minha visão sobre a situação na qual me encontrava.
Bernardo, desde o começo, foi muito gentil comigo e me tratou tão bem quanto eu jamais poderia imaginar, aliás, para ser bem sincero, toda a família agiu dessa maneira comigo. Porém, toda vez que eu pensava na figura do Bernardo e o quanto eu estava agradecido por ele aparecer naquela estranha floresta e  me salvar, algo mais que gratidão me vinha a mente.
Depois da conversa com Luíz, eu percebi que toda vez que Bernardo conversava comigo, eu tinha vontade de abraçá-lo, porém, erroneamente, interpretava como pura gratidão, quando na verdade, me interessei fisicamente por ele desde o primeiro contato. A pura atração física se intensificou ainda mais durante o curto período em que temos convivido, afinal, Bernardo é encantador e tem um jeito muito singular de se portar.
Ainda permaneci muito tempo refletindo sobre o assunto, sozinho no sofá, até que ouvi um barulho na cozinha. Então me levantei  pera verificar quem ainda estava acordado, e, para minha surpresa e nervosismo, era Bernardo.

- Oi Bernardo, pensei que já estivesses dormindo.
- Oi Felipe. Eu acordei de repente e ainda não consegui voltar a dormir, então vim tomar um pouco de água.
- Entendo. Eu já estava subindo para o meu quarto quando ouvi um ruído aqui.
- Eu não sou a pessoa mais discreta do mundo, na verdade todos dizem que sou um pouco estabanado. O barulho que você ouviu foi do meu tropeço na cadeira.
- Bom, ainda bem que você não se machucou.
- É verdade! Você já vai subir para o quarto?
- Já! Estou com muito sono nesse momento.
- Então eu vou com você.

Eu fiz como Luíz dissera, parei para observar Bernardo mais atentamente. Naquele breve momento na cozinha pude perceber que por trás de todo o seu porte atlético havia alguém muito gentil e humilde, o que me encantou muito. Quando chegamos à porta do meu quarto, Bernardo se despediu de mim com um toque em meu ombro, que me levou às nuvens, principalmente pela suavidade com que ele o fez. Embora quisesse pensar um pouco mais em tudo isso quando adentrei o quarto, meu corpo não resistiu e adormeci assim que me deitei.


domingo, 17 de março de 2013

Capítulo 2 - Caminhos Cruzados (Cont.)

Depois desse acontecimento, Enzo e Vitor continuaram normalmente e unicamente com a relação fraternal. A primeira vez em que Enzo realmente se envolveu com um garoto, intencionalmente, foi aos onze anos, em uma parte do playground da escola na qual poderia realizar um desejo que tinha há algum tempo com total discrição, visto que já sabia das implicações sociais.
O primeiro beijo ocorreu naquele local, com um garoto chamado Ângelo, que mal sabia como começar o processo, ou seja, foi um acontecimento desajeitado. As próximas experiências vieram no decorrer dos anos, trazendo pessoas mais experientes e que sabiam muito mais sobre a arte do beijo.
A iniciação sexual ocorreu aos catorze anos, com um amigo da escola, chamado Marcos, que há muito sabia da orientação sexual de Enzo, e que, embora nunca houvesse tido nenhuma experiência com outros garotos, se interessou de uma maneira especial por ele. Dessa forma, as conversas evoluíram para beijos, que evoluíram para "amassos", terminando na primeira relação sexual de ambos.
Enzo e Marcos chegaram a namorar por seis meses, porém a relação não amadureceu, tanto pelo fato do impedimento social advindo do medo de ambos em relação à discriminação por outras pessoas, como pela diminuição do interesse mútuo entre ambos. Então, no fim, os dois se tornaram apenas bons amigos, que mantiveram uma excelente amizade durante o período escolar.
Um período marcante da vida de Enzo foi a grande "revelação" para os pais, pois ele sempre fora um jovem muito sincero com os outros e verdadeiro consigo, de modo que manter segredo em relação a esse tema era inadmissível para ele.
Após começar um namoro aos dezesseis anos com um rapaz chamado Guilherme, que conhecera através de amigas, o jovem sentiu a necessidade de simplesmente revelar a seus pais a forma como se relacionava emocionalmente com os homens. Esta necessidade surgiu, principalmente, porque ele começara a adquirir maior estabilidade nas suas inter-relações e desejava mostrar isso aos pais.

Devido à grande maturidade que Enzo demonstrou ao contar a seus pais sobre sua orientação sexual, o impacto foi bem menor, pois, embora seu pai e sua mãe tenham mostrado certa resistência ao assunto, no decorrer de poucos dias haviam assimilado bem a realidade, de modo que realizaram milhares de recomendações e orientações típicas de quaisquer pais, porém, com o diferencial de abordarem uma relação homoafetiva.
O namoro de Enzo e Guilherme durou até o fim do ensino médio, quando Guilherme passou em uma universidade pública de São Paulo. Porém, durante o tempo em que namoraram, Guilherme frequentou normalmente a casa de Enzo como seu namorado, além disso, os dois tentaram manter contato, mas decidiram de comum acordo que o namoro a distância não funcionaria.
Na mesma época em que Guilherme se mudou para São Paulo, Enzo passou na Universidade Federal de Tupã - UFTU em Medicina, o que originou uma grande festa por parte de toda a sua família e amigos e deu início a uma nova fase na vida do jovem.

domingo, 10 de março de 2013

Capítulo 1 - Um Lugar Estranho Com Pessoas Acolhedoras (Cont.)

Poder tomar um banho, naquele momento, me permitiu pensar o quanto tudo aquilo estava sendo muito estranho e prazeroso ao mesmo tempo, afinal, me sentia como se realmente fizesse parte daquela família, apesar de conhecê-los a pouco menos de um dia.
Quando terminei o banho, quase que sincronizadamente, ouvi alguém bater na porta. Deduzi que fosse Bernardo, é claro. Ao abrir a porta lá estava ele com sua postura marcante, tão sorridente e jovial, com a toalha e as roupas de Luíz nas mãos. Peguei-as das mãos dele e agradeci, então ele se retirou e me deixou sozinho para que pudesse trocar de roupa no banheiro.
As roupas de Luíz couberam muito bem em mim, e regozijei por poder vestir roupas macias, cheirosas e que não estivesses rasgadas. Após terminar de me vestir, fui até a sala, onde encontrei Luíz e seu namorado novamente.

- Vejo que as minhas roupas te serviram bem Felipe!
- Sim, muito obrigado Luíz, me sinto renovado com estas roupas.
- Disponha, é um prazer ajudar. Mas me fala, ainda não lembrou como foi parar na Floresta do Leste?
- Não, é muito estranho, mas simplesmente não sei como acordei ali.
- Eu entendo. Mas você vai lembrar, eu tenho certeza.
- Assim espero. 

Enquanto tínhamos essa conversa, eu estava sentado em um sofá, enquanto Luíz e seu namorado estavam em outro. Posteriormente, Bernardo adentrou a sala e, como não havia lugar no outro sofá, ele se sentou ao meu lado. Nesse momento, senti algo diferente por ele estar tão perto de mim, pois percebi que era a primeira vez que ficávamos a uma distância tão curta, tanto que podia sentir o seu braço, bastante musculoso, tocar em mim, considerando-se que o sofá não era muito largo. Ao se sentar ele iniciou outra conversa.

- Luíz, você já apresentou o Henrique para o Felipe?
- Claro mano, estávamos até conversando tranquilamente aqui.
- Que bom. E você Felipe, se sente melhor depois de um bom banho e vestindo roupas novas?
- Claro Bernardo, estava até comentando que me sinto renovado.
- Fico feliz, espero que estejas à vontade. Não se preocupe com nada viu, meu pai disse que você pode ficar aqui o tempo que quiser, principalmente porque você não lembra como foi parar na Floresta do leste.
- Muito obrigado a todos você! Nossa, eu nem sei como vou retribuir toda essa gentileza.
- Você pode nos contar um pouco de você pra começar.
- Parece justo Luíz, o que vocês querem saber?
- Você tem família ou alguém mais te esperando em algum lugar?
- Olha, pra falar a verdade Luíz, apenas meus pais estão me esperando no lugar de onde eu vim.
- Não tens namorado lá?
- Não Luíz, sou um solteirão mesmo! E vocês a quanto tempo namoram?
- Eu e o Henrique namoramos há uns dois anos.
- Nossa, bastante tempo heim. E você Bernardo?
- Bom Felipe, eu, assim como você, estou solteiro. Ainda não encontrei alguém legal como o Luíz encontrou o Henrique.

Confesso que saber que o Bernardo estava solteiro mexeu bastante comigo, de uma maneira que nem eu mesmo compreendi totalmente até aquela altura. Um outro ponto é que, eu percebi que a homossexualidade, com certeza, não era um problema naquele contexto, aliás, não precisei de nenhuma explicação formal para entender que a minha orientação sexual, naquela casa, até quele momento, era efetivamente considerada normal. Bastante diferente da minha "realidade", onde o máximo que conseguiria nesse aspecto era um status de "aceitável", porém, jamais normal. Essa associação me deixou bastante feliz e cada vez mais encantado com aquele lugar.

domingo, 3 de março de 2013

A Época de Ouro


A Época de Ouro

Esse conceito é muito bem trabalhado no filme "Meia Noite em Paris" e se refere a um momento do passado que parece ter sido o melhor que a humanidade já viveu.
O mais interessante é que, pra cada geração, a percepção de qual foi esse momento se modifica constantemente, pois para cada pessoa ou mesmo grupo de pessoas, há sempre alguma coisa que não se encaixa no contexto sócio-histórico em que vive, portanto, instaura-se a sensação de que as pessoas que viviam nesse determinado momento histórico definido como época de ouro são as sortudas, embora, como é demonstrado no filme citado, as dita-cujas pudessem ter a mesma percepção sobre outro momento histórico.

O mais importante a se depreender é que, independente do momento sócio-histórico em que se vive, sempre haverá algo que não se encaixa mesmo. O motivo disso é porque o processo de subjetivação de cada um é muito distinto para realmente se conseguir a proeza de se encaixar perfeitamente dentro dos parâmetros da sociedade. De fato, a obsessão por esse ´"encaixe perfeito", em muitos casos leva ao desenvolvimento de uma série de desvios comportamentais ou processos de adoecimento psíquico, visto que, como já afirmado, há sempre uma parte que não se encaixa, o que leva à frustração e infelicidade com a vida.

O conceito de época de ouro, ou qualquer outro termo similar, se refere a um mecanismo psicológico saudável frente a esse "desencaixe", pois é através dele que se pode aceitar aquilo que não se encaixa e viver de forma plena o momento atual, convivendo com aquilo que me faz pertencer a atual sociedade e aquilo que me diferencia.

Um problema real é quando este mecanismo é radicalmente utilizado por alguém, de forma a mediar um total deligamento da dinâmica social em que está inserido, em favorecimento de uma ligação com o momento definido como época de ouro. A partir do momento que há deligamento da dinâmica social, há fortes repercussões na vida do sujeito, pois o processo de subjetivação é intrinsecamente relacionado com o contexto sócio-histórico.

Dessa forma, considera-se importante resguardar a relação intima entre o individuo e sociedade em que ele está inserido, de modo que haja consonância entre semelhanças e diferenças existentes ele e os diversos sujeitos integrantes desta sociedade, a fim de preservar a saúde global e assegurar a plena participação social.