quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Capítulo 4 - (Re) aprendendo a Viver (Cont.)

Na mesma semana, Enzo ainda teria mais um atendimento com Lucas, porém ele ficou surpreso em saber que ele seria atendido por outro discente de Terapia Ocupacional, cujo nome era João. O rapaz lhe explicou que Lucas tinha adoecido e não poderia atendê-lo naquele dia.
No dia anterior ele tinha tido um dia bastante difícil na sessão de Fisioterapia, já que o tratamento ambulatorial seria um pouco diferente do que ele estava acostumado no hospital e hoje ele estava ainda mais cansado devido ao atendimento realizado por João. Entretanto, naquele dia o seu humor estava bem melhor do que na semana passada, visto que ele estava finalmente de volta ao seu lar e a sua relação com Daniel estava cada dia mais sólida. Nesse sentido, ele se sentia um pouco culpado por ter tratado Lucas de forma tão bruta anteriormente. Além disso, ele estava curioso para saber por que o rapaz o havia tratado tão bem. Não havia nenhum tipo de interesse afetivo ou sexual, ele apenas se sentia curioso, porque, ainda que evidentemente os discentes tenham que tratar bem os seus pacientes, ele sentiu um tipo de tratamento diferente por parte de Lucas durante a sessão da semana anterior.
Depois da sessão, Enzo encontrou Daniel na "Snacks", como eles haviam combinado no dia anterior, já que o rapaz não poderia acompanhar o namorado nas sessões de Fisioterapia e Terapia Ocupacional porque tinha aula no mesmo horário e já que ele quase perdera o semestre por faltas, ele não poderia estar ausente de nenhuma aula dali por diante. Ao percorrer os corredores da UFTU com a cadeira de rodas, Enzo se sentia desconfortável, mas o sorriso no rosto de Daniel quando ele chegou na lanchonete amenizou aquele sentimento. Quando ele se aproximou da mesa em que Daniel estava, este se levantou e disse:

- Espera - disse ele movendo uma cadeira para que Enzo pudesse se posicionar perto da mesa - Pronto, agora você tem um espacinho para a sua cadeira particular! - concluiu ele beijando Enzo.
- Sim, esse monstro que está acoplado ao meu corpo! - disse Enzo rindo - Mas vamos esquecer dele e nos concentrar em você - Enzo tocou o rosto de Daniel - Como foi a aula hoje?
- Ah, foi bem interessante para mim, mas provavelmente se eu comentar será bem entediante para você Sr. Ciências da Saúde! Na verdade, eu prefiro que nós conversemos sobre o seu atendimento de hoje! Como foi? Você maltratou o seu terapeuta de novo? - respondeu Daniel rindo.
- Cale a boca Sr. Ciências Humanas! Eu não maltratei ele, eu apenas estava um pouco estressado! Mas de qualquer forma ele não foi hoje e eu fui atendido por outra pessoa.
- Meu deus! Você assustou tanto o rapaz que ele até desistiu do curso! Nossa, você é muito malvado amor!
- Deixa de ser palhaço! Eu não sou malvado!
- Não tem problema amor! Eu amo o meu malvadinho!
- Eu também te amo palhacinho! Qualquer dia eu vou sentar você aqui no meu colo e lhe dar umas palmadinhas, para você ver como eu sou malvado, então!
- Hmm! Parece bom! Quer fazer isso agora ou depois? - os dois começaram a rir.

Os dois permaneceram conversando na lanchonete até uma hora da tarde, quando Daniel disse:

- Amor, eu acho melhor eu te levar logo para casa, já que eu tenho que estar de volta às duas da tarde para a minha próxima aula!
- Tudo bem amor, mas se você quiser eu posso pedir para o meu pai vir me buscar ou mesmo pegar um ônibus! - respondeu Enzo.
- De jeito nenhum! Eu não estou fazendo nada mesmo! Outro dia você faz uma dessas alternativas, mas hoje eu quero lhe levar até a sua casa!
- Entendido senhor! - disse Enzo batendo continência.
- Ah, então eu não o único palhaço aqui né?
- Bem, na verdade não, mas você com certeza me ganha nesse quesito!

Desse modo, Daniel levou Enzo até a cada do rapaz e depois voltou para a UFTU. Quando chegou em casa, Enzo prontamente deitou para descansar do esforço realizado no atendimento. Quase no fim daquela tarde, Pietro apareceu para conversar com o rapaz:

- Oi Enzo, como você está?
- Oi Pietro - respondeu Enzo - Eu estou bem, mas e quanto a você? Pareces um pouco tenso hoje!
- E eu estou mesmo amigo... eu preciso te contar uma coisa... mas eu não sei como...
- Nossa Pietro, não me deixa nervoso! Conta logo! Eu não vou te julgar ou rir se for algo sério!
- Na verdade isso não é bem sobre mim... por isso eu não sei se deveria te contar, mas eu realmente não sei como reagir a isso!
- Como assim? É algo sobre o Gui? O que é Pietro, e conta! - disse Enzo aflito.
- Sim... Bem, eu preciso te contar isso, porque a minha cabeça está a mil!
- Tudo bem, mas se acalma primeiro e me conta todos os detalhes do que está acontecendo.
- Ok - respondeu Pietro, e depois de um profundo suspiro ele continuou - Bem, eu e o Guilherme estamos em uma relação, como você sabe, então há alguns dias nós combinamos de fazer um teste de HIV para ter certeza de que nós estaríamos livres de preocupações em relação a isso. Bem... o problema é que o teste do Guilherme deu positivo...
- Meu deus! - exclamou Enzo - Mas por que ele não está aqui com você me contando isso?
- Ele meio que ficou transtornado com a notícia e disse que queria ficar sozinho e... bem, eu também preciso de um tempo para pensar nisso na verdade.
- Mas o que está se passando pela sua cabeça Pietro?
- Muita coisa Enzo! - respondeu o rapaz - Eu não tenho muita experiência sexual, então estava praticamente tranquilo quanto a isso. Nós usamos camisinha, mas, eu não sei, eu sinto como se eu pudesse mesmo assim ter contraído o vírus. Eu gosto dele Enzo, por isso não queria deixar isso atrapalhar o que nós estamos começando, mas isso parece ter me afetado tanto quanto a ele.
- Calma Pietro! Olha, se vocês usaram camisinha, então as chances de teres contraído é muito pequena ou quase nula. Além disso, hoje em dia existem muitas alternativas para tornar a vida do Gui o mais fácil possível e talvez ele nem desenvolva AIDS, que é o que realmente precisa ser evitado a todo custo.
- Eu sei Enzo, mas eu vou ter que me proteger a todo custo e estar sempre alerta dentro desse relacionamento!
- Ah Pietro, é claro que você vai precisar se proteger para não contrair o vírus, mas não pense que você vai ter que ficar paranoico em relação a isso! Com os cuidados necessários, vocês dois vão poder seguir com a relação normalmente! - assegurou Enzo.
- Bem, eu acho que você tem razão! Desculpa, eu acho que eu reagi exageradamente a isso! Mas é que eu realmente não esperava isso!
- Que nada Pietro, isso é compreensível! Eu acho que a ideia de vocês foi ótima e, em um certo ponto de vista, isso foi bom, pois revelou algo sério que precisa ser tratado e que vai afetar um pouco a relação de vocês - respondeu Enzo - Por isso, eu acho que vocês dois precisam conversar sobre isso e realizar os procedimentos necessários daqui para frente.
- Sim, eu vou fazer isso! Obrigado por me ouvir Enzo, eu acho que era somente disso que eu precisava! Alguém que me passasse segurança! - disse Pietro abraçando Enzo.
- De nada amigo! Eu espero que dê tudo certo! - respondeu Enzo - Eu vou esperar o Gui vir conversar comigo e, se você quiser, eu posso fingir que não sei de nada! - ele finalizou rindo.
- Obrigado - disse Pietro, também rindo - Isso seria ótimo! Afinal eu não tinha o direito de revelar isso sem o consentimento dele.
- Então assim será! - assegurou Enzo - Olha, essa iniciativa de vocês até me motivou sabia?! Eu acho que todos os casais e, na verdade, todas as pessoas que têm uma vida sexual ativa precisam fazer periodicamente um teste para verificar HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis! Eu acho até que farei isso!
- Bem, na verdade essa foi uma iniciativa do próprio Guilherme - disse Pietro - Eu fiquei um pouco resistente no começo, já que, como eu disse, eu não tenho uma vasta vida sexual, mas depois eu pensei ' por que não né?' e, bem, graças a deus que eu topei!

Nesse momento, a campainha tocou e Pietro foi até a porta, onde ele encontrou Daniel do lado de fora:

- Oi Daniel, pode entrar!
- Oi Pietro! Como estás? - disse Daniel um pouco surpreso - O que aconteceu, o Enzo te contratou para atender à porta?
- Não amor, isso é trabalho escravo mesmo! Esqueceu que eu sou malvado? - respondeu Enzo rindo.
- O que? - disse Pietro sem entender.
- Nada Pietro, eu estou apenas brincando! - respondeu Enzo - É que o meu namorado acha que eu sou malvado com as pessoas!
- Você não soube Pietro, que o seu amigo maltratou o terapeuta ocupacional dele no primeiro atendimento?
- Não estava sabendo disse Enzo! Como assim?
- O Daniel faz tudo parecer horrível! Ele é muito exagerado! - protestou Enzo - Eu não "maltratei" ninguém! Eu apenas estava um pouco mal-humorado naquele dia e talvez eu possa ter sido um pouco ríspido com o meu terapeuta.
- Ah, então é isso! Bem, então não faça mais isso Enzo, ou então eu também vou acreditar que você é malvado - disse Pietro rindo.
- Ai, o que eu fiz para merecer vocês dois!
- Boa coisa não foi! - disse Daniel enquanto abraçava e beijava o namorado.
- Bem gente, eu não vou atrapalhar o momento de vocês, então eu já estou de saída! - disse Pietro.
- Já?! - exclamou Enzo.
- Que isso Pietro, pode ficar aí! Você não está atrapalhando nada! - respondeu Daniel.
- Obrigado Daniel, mas eu realmente preciso ir! Além disso, eu já conversei bastante com o Enzo hoje e ele me deus ótimos conselhos, que eu preciso colocar em prática.
- Tudo bem então, até mais! E boa sorte com o que precisas resolver!
- Obrigado Daniel! - disse Pietro enquanto se dirigia a Enzo, e enquanto o abraçava disse: - Muito obrigado amigo!
- De nada! Eu quero saber de tudo depois viu!
- Pode deixar!

Assim, Pietro deixou a casa de Enzo decidido a colocar em prática o que Enzo lhe dissera sobre a situação que ele estava vivendo com Guilherme atualmente. Depois que ele saiu, Daniel perguntou a Enzo:

- Do que ele estava falando amor? Que conselhos você eu a ele?
- Amor... - disse Enzo incerto - Eu acho que não posso revelar isso por enquanto, então você vai ter que acreditar em mim quando eu digo que é uma situação um pouco complicada.
- Bem, eu acredito em você. Mas isso é tipo um segredo?
- Não é bem um segredo, mas é algo que envolve outra pessoa que ainda não me contou esse algo e por isso e não posso falar disso, porque tecnicamente eu não sei de nada ainda... - disse Enzo - Espera, isso fez sentido?
- Não muito - disse Daniel rindo - Mas tudo bem, eu vou entender que você vai falar sobre isso comigo somente daqui a algum tempo, certo?
- Certíssimo amor! - disse Enzo - Você é o melhor namorado! Lindo e inteligente!

Daniel ficou com Enzo até dez horas da noite e depois foi para casa. Depois que o namorado saiu, Enzo deitou e, enquanto lia um livro, refletia sobre o que Pietro havia lhe contado sobre Guilherme. De repente, uma pergunta veio em sua mente 'Desde quando Guilherme estava infectado com o vírus HIV?', a qual veio seguida de outra 'Se ele já estivesse com o vírus na época em que nós namoramos, então eu poderia ter contraído, já que nós chegamos a fazer sexo sem camisinha?'. Com esses pensamentos em mente, Enzo decidiu que no dia seguinte ele faria um teste para tirar a dúvida de sua cabeça e, pensando ainda mais no assunto, ele resolveu que convidaria Daniel para fazer isso com ele.
Dessa forma, quando Daniel apareceu no dia seguinte para visitá-lo, Enzo prontamente disse:

- Amor, eu quero que a gente faça um teste de HIV!
- Como assim amor? - disse Daniel perplexo - Por que esse desejo repentino de fazer um teste desse tipo? Tem algo errado amor?
- Não amor, fica tranquilo! Está tudo bem comigo! - assegurou o rapaz - Porém, eu já tive uma vida sexual antes de você e eu quero que nós fiquemos tranquilos em relação a isso, já que nós já iniciamos nossa vida sexual juntos! Eu li em uma revista que vários casais, principalmente em relações homoafetivas, fazem isso ao iniciar um relacionamento!
- Bem, se você realmente quer fazer isso, eu não vejo problemas! Mas nós estamos um pouco atrasados né? Já que a nossa relação não está no começo e nós inclusive já fizemos sexo - disse Daniel rindo.
- Você tem razão! - respondeu Enzo também rindo - Porém - ele adotou um tom mais sério - Eu realmente quero fazer isso, mesmo assim! Eu quero ficar tranquilo quanto a isso! Bem, eu quero que você faça comigo mais por que eu quero a sua companhia, mas você praticamente não teve vida sexual ativa até agora, então é mais por mim mesmo.
- Tudo bem amor! Se você quer, nós vamos fazer isso sim! - respondeu Daniel - Inclusive vamos marcar isso agora - disse ele tirando o notebook da mochila.

Os dois marcaram a coleta de sangue para terça-feira da próxima semana, depois da sessão de Terapia Ocupacional de Enzo.
Na terça-feira, enquanto aguardava ser chamado na sala de espera, Enzo viu Lucas passar em direção à sala de Terapia Ocupacional, porém, quando este veio lhe chamar para o atendimento, ele estava na companhia de João, o qual, segundo Lucas, seria o discente responsável pelo seu caso dali para a frente pois ele não poderia mais atendê-lo. Assim, João novamente realizou o atendimento com Enzo, focando principalmente no treino do uso da cadeira de rodas.
Enzo não compreendia o porquê de Lucas ter repassado o seu caso para outra pessoa sem uma explicação plausível e resolveu que ele iria indagá-lo sobre isso na próxima oportunidade que ele tivesse de conversar a sós com o rapaz. Isto ocorreu bem antes do que ele imaginava, já que, quando ele estava na saída da Clínica de Reabilitação da UFTU, alguém tocou em seu ombro e disse:

- Desculpa Enzo, mas você esqueceu o seu celular na mesa - disse Lucas.
- É mesmo! Obrigado Lucas!
- De nada! Bem, tenha um bom dia! - disse o rapaz virando-se em direção ao interior da clínica novamente.
- Espera Lucas! - disse Enzo.
- Sim...
- Eu posso te perguntar uma coisa?
- Ah, eu acho que sim... o que é?
- Por que você simplesmente repassou o meu caso para outra pessoa?
- Err... Eu tive alguns problemas na quinta-feira passada e não pude atendê-lo, então, como o João disse que o primeiro atendimento de vocês foi ótimo, eu preferi repassar você para ele... afinal, eu acho que você se sentiu mais à vontade com ele de qualquer modo, certo?
- Ah... Olha, sobre isso, eu queria me desculpar se eu fui um pouco grosseiro com você semana passada, mas eu realmente não estava me sentindo muito bem! Se isso lhe deu uma impressão errada sobre mim e por isso você me repassou, eu acho que isso deveria ser revertido.
- Olha, na verdade, esse não foi o real motivo Enzo e eu não tenho tempo suficiente para explicá-lo agora, mas eu não posso mesmo voltar a te atender, tudo bem?
- Mas qual o problema então?
- Faz o seguinte, pergunta para o seu namorado, se o meu nome o lembra de alguma coisa e na quinta-feira a gente conversa sobre isso, pode ser?
- Bem, eu acho que sim... mas eu não entendo o que o Daniel tem a ver com isso!
- Você vai descobrir! - assegurou Lucas - Agora eu realmente preciso ir! Te vejo na quinta-feira!

Enzo ficara ainda mais curioso em relação àquele rapaz e agora estava muito mais interessado em descobrir o porquê da troca de discentes para o seu atendimento, principalmente porque, de alguma forma, Daniel estava envolvido nisso.

sábado, 8 de novembro de 2014

Basket et Maths (Basket et Maths)

Basket et Maths (Basket et Maths), 2009


O curta fala sobre Jérôme (Jean-Denis Marcoccio) e Cédric (Aurélien Baty) são dois jovens que jogam no mesmo time de basquete. Um dia, durante uma tutoria em matemática, Cédric se inclina e beija Jérôme. Isto causa uma mistura de sentimentos para os dois e, enquanto Jérôme se descobre apaixonado, Cédric apresenta certa resistência em aceitar o que sente pelo companheiro de time.

  

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quarta-feira, 5 de novembro de 2014

À Cause D'un Garçon (À Cause D'un Garçon)

À Cause D'un Garçon (À Cause D'un Garçon), 2002


Vincent (Julien Baumgartner) é um garoto de 17 anos de idade, o qual é um excelente aluno, um nadador campeão, popular entre os amigos, bonito e adorado pelas meninas na escola. Entretanto, apesar de ser homossexual, o garoto esconde este fato de todos e vive uma vida de mentiras na qual ele tem uma namorada, Isso muda, quando ele conhece Benjamin (Jérémie Elkaim), por quem ele tem uma repentina "queda" e que, acidentalmente, revela o seu segredo para as pessoas. A partir daí, Vincent precisa começar a aceitar e lidar com a sua orientação sexual e com as diferentes implicações que ela tem para os seus amigos, família e demais conhecidos.

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terça-feira, 4 de novembro de 2014

Capítulo 6 - Revolução: Pasine (Cont.)

Eu saí correndo pelas vielas do vilarejo, desejando desesperadamente encontrar Bernardo e, ao mesmo tempo, com medo da reação dele. Eu o encontrei na praça central do vilarejo, onde ele estava conversando, de costas para mim, exaltadamente com Raul, em meio às diversas outras pessoas que estavam nas missões de mapeamento. Eu andei devagar, mas decidido a falar com ele. O meu coração batia acelerado e as minhas mãos estavam úmidas de suor, pois eu não queria ser acusado de algo que eu não fiz no meio de outras tantas pessoas. Porém, para minha surpresa, quando eu toquei no ombro de Bernardo, este se virou em minha direção, agarrou-me em seu colo e me beijou apaixonadamente. Eu estava confuso, mas não me importei em apenas deixar aquele momento acontecer. Quando senti que estava preparado, eu disse:

- Meu amor, aquilo que você viu... Eu não estava lhe traindo... O Hugo...
- Eu sei, eu sei! Calma meu amor!
- Como assim você sabe?
- Eu sei que você não faria isso comigo! Eu confio em você!
- Mas por que você correu de mim então?
- Felipe... por mais tranquilo que eu possa parecer, eu posso ficar bastante agressivo em certas situações e... bem, alguém tentando beijar o meu marido com certeza é uma dessas situações, então eu preferi vir aqui informar ao Raul que ele precisa tomar conta do namorado dele, antes que eu o agrida!
- Sério?! Meu amor, isso é tão bom! Você confia mesmo em mim!
- É claro! Não seja bobo! Eu nunca mais desconfiarei de você depois do erro desastroso que eu cometi na situação com o William há alguns meses! Bem, eu quase lhe perdi... Eu não quero me afastar de você ou lhe julgar sem que você tenha uma chance de se explicar! Além disso, tem mais uma coisa...
- O que meu amor?
- O Hugo também tentou algo comigo alguns dias antes de eu sair para a minha missão e eu o adverti para que ele parasse com aquilo imediatamente e fosse fiel ao Raul, de modo que eu não comentaria nada com ninguém... Bem, pelo visto ele não conseguiu, certo?
- Mas que atrevido! Eu vou ensinar uma lição para ele agora mesmo!
- Não meu amor! O Raul acabou de sair daqui e acho que eles têm muito o que discutir! O que você acha de nós darmos uma volta pelo vilarejo? Eu estou louvo para ouvir o que aconteceu por aqui na minha ausência e também quero lhe contar o que ocorreu na minha missão!
- Claro meu amor! Vamos fazer isso!

Nós andamos pelas vielas, nas quais nós encontramos várias pessoas que estavam revendo os seus entes queridos e comemoravam o fato de todos estarem bem. Eu contei a Bernardo que as coisas tinham transcorrido com tranquilidade no vilarejo e a maioria das atividades tinham sido mantidas normalmente. Em contrapartida, ele me contou o que acontecera desde que ele saíra de Finnel:

- Bem, nós alcançamos um pequeno vilarejo o anoitecer do dia em que o meu grupo saiu de Finnel. Como nós não tínhamos certeza sobre a fidelidade dos habitantes, nós apenas nos alojamos na casa de um ancião que parecia ser o líder. Na manhã seguinte, nós nos separamos e investigamos discretamente a opinião dos diversos habitantes sobre Conde Rafael. No final do segundo dia, nós concluímos que o vilarejo estava submetido à influência de do seu tio, mas eles não estavam satisfeitos com isso, então nós decidimos conversar com o homem em cuja casa nós estávamos hospedados, a fim de oferecer uma parceria com Finnel para que o vilarejo pudesse se libertar da influência de Conde Rafael, o que foi muito bem recebido e aceito. Assim, no terceiro dia, o ancião convocou uma reunião na praça da cidade e convocou todos os habitantes, de modo a compartilhar a ideia e verificar a opinião deles sobre a união com Finnel. Infelizmente, algumas pessoas alegaram fidelidade a Conde Rafael, as quais foram neutralizadas e trazidas conosco para cá. Porém, a maioria acatou a ideia de se unirem ao nosso vilarejo, então nós temos outro aliado agora! Eu informei que as pessoas que se interessarem em treinamento de batalha podem vir a Finnel para serem treinado por nós, então provavelmente algumas pessoas chegarão nos próximos dias.
- Isso é incrível Bernardo! Bem, então eu acho que a finalização das outras casas que nós estávamos construindo aconteceu bem a tempo, eu acho!
- Com certeza! Essas pessoas vão precisar de um lugar para ficar! Mas, mudando de assunto, eu senti muito a sua falta! Eu queria ter voltado antes, mas nós passamos todo o terceiro dia acertando os termos da aliança entre os dois vilarejos! Mas eu parti no final da tarde do terceiro dia, para poder chegar hoje de manhã aqui! Viajar à noite não é o ideal, mas os outros entenderam que eu precisava lhe ver e foram bastante compreensivos.
- Eu também senti muito a sua falta meu amor! Bem, então você deve estar cansado! Vamos para casa, eu acho que o Raul e o Hugo não estão mais lá!

Nós caminhamos de volta para a nossa casa, onde nós de fato não encontramos Raul ou Hugo. Bernardo apenas deitou em nossa cama e adormeceu. Como eu tinha acabado de acordar, eu não me juntei a ele. Enquanto ele permaneceu dormindo em nossa casa, eu fui falar Raul, por motivos pessoais e também relativos à missão dele. Eu me dirigi à casa dele, na qual eu fui recebido surpreendentemente bem por ele:

- Olá Felipe! Pode entrar!
- Você não parece bem mestre!
- Faz algum tempo que você deixou de ser meu discípulo! De fato, é você quem tem me ensinado coisas atualmente.
- Você sempre vai ser meu mestre! Afinal, eu não estaria aqui sem o que você me ensinou! Não só as estratégias de batalha, mas também como ser mais forte e decidido!
- Eu fico lisonjeado! Agora pare de me bajular e diga o que você quer!
- Aí está! Agora sim, esse é o meu mestre! Insultos para dar e vender! Eu vim aqui perguntar se você precisa conversar com alguém sobre a missão ou... bem, sobre o que mais quiseres!

Para me surpreender ainda mais, eu presenciei Raul, aquele que me ensinou a ser forte e evitar demonstrar minhas fraquezas, começar a chorar. Ele se sentou e eu o acompanhei, sem saber o que fazer, até que ele falou:

- Eu não entendo Felipe... O que eu tenho de errado? Por que as pessoas fogem de mim?
- Raul, eu não sei sobre errado, mas eu posso ser sincero sobre uma coisa?
- Claro! Fique à vontade!
- As pessoas podem ficar um pouco intimidadas pelo modo como você trata tudo com tanto rigor! Uma relação é um pouco mais complexa do que uma estratégia de batalha! Não há, de maneira alguma, um jeito de você planejar isso! De fato, você apenas vive e faz o seu melhor para que isso funcione! Mas um pouco de flexibilidade é sempre útil!
- Então você está dizendo que o Hugo me traiu porque eu não sou flexível?
- Eu não sei o porquê do Hugo ter agido dessa forma! Só estou apontando algo que eu percebi sobre você Raul! Quem sabe o que está se passando na cabeça dele, né?
- Eu não sei o que dizer... Eu sou assim...
- Eu não estou sugerindo que você mude qualquer coisa! Apenas estou apontando uma percepção minha e lhe dando um conselho e amigo, totalmente com boas intenções!
- Obrigado Felipe! Fico feliz em saber que você me considera um amigo!
- Você salvou a minha vida Raul! Não há nada que eu possa fazer que vá retribuir o suficiente o que você fez naquele dia! Eu vou te abraçar agora e não quero ser rejeitado, ok?

Raul aceitou o meu abraço e o retribuiu, apesar de estar visivelmente desconfortável com a situação. Em seguida, eu o indaguei sobre a missão:

- Mudando de assunto, com foi a missão? Boas notícias vindas do Leste?
- Bem, eu acho que sim... Olha, os habitantes do vilarejo são todos pacifistas, então não estão do lado de Conde Rafael, o que é uma boa notícia, porém também não querem se juntar a nós em uma luta contra ele. Entretanto, eu estabeleci com eles uma aliança comercial, para que nós possamos comercializar produtos! Bem, nós tecnicamente temos aliados no leste, já que eles pelo menos estão dispostos a estabelecer algum tipo de relação com o nosso vilarejo. De qualquer forma, eu ofereci abrigo a qualquer pessoa que se interesse por batalhas, mas não queira envolver o seu vilarejo nisso, ou seja, qualquer deles que seja um guerreiro pode se juntar a Finnel como morador.
- Isso é ótimo Raul! Essas são realmente ótimas notícias! Nós precisamos de todo e qualquer tipo de apoio na nossa jornada! Além disso, Finnel tem prosperado bastante na produção de vários produtos, então acho que essa aliança seria uma boa forma de arrecadar mais fundos para armas.
- Bem, essa foi a minha jornada. Agora precisamos esperar pelos outros dois grupos, para que nós possamos analisar os resultados e planejar os nossos próximos passos!
- Exato! Bem, eu acho que você está cansado Raul, então eu vou te deixar descansar! Qualquer coisa, não hesite em me procurar na minha casa!
- Tudo bem, obrigado... discípulo!
- De nada, mestre!

Depois que eu saí da casa de Raul, eu caminhei em direção à praça central do vilarejo, porém fui interceptado por Hugo em uma das ruas, o qual indagou:

- Felipe, eu posso falar com você?
- Hugo, eu realmente não quero conversar com você agora!
- Mas eu preciso apenas te dizer uma coisa...
- Tudo bem, então diz enquanto nós caminhamos, porque eu não tenho tempo para perder com você!
- Felipe, eu gosto mesmo de você!

Eu não consegui reagir tão bem àquilo como eu gostaria, já que eu, em um impulso, empurrei com um braço o peito de Hugo contra a parede de uma casa e pus meu outro braço sob o queixo dele, dizendo:

- Qual é o seu problema? Se você gosta mesmo de mim, então por que também flertou com o meu marido há alguns dias? Você muda tão rápido assim de sentimento ou só tem problemas mesmo?

Para a minha surpresa, ele começou a chorar copiosamente e disse entre soluços:

- Eu não sei!

Ao ver o sofrimento nos olhos dele, eu o soltei e, desconcertado, indaguei:

- Como assim?
- Eu não sei qual o meu problema!
- Eu peço desculpas pelo que acabou de acontecer Hugo! Você está com algum problema? Quer conversar?
- Sim...
- Vem, vamos até a praça! Lá nós podemos sentar e conversar melhor.

Nós caminhamos até a praça e nos sentamos em frente a uma estátua recém construída, a qual era um símbolo da nossa luta e uma homenagem às pessoas que morreram por causa do ódio de Conde Rafael contra os homossexuais, a qual consistia em dois homens, duas mulheres e um casal heterossexual de mãos dadas. Quando nos sentamos, Hugo havia parado de chorar, então eu perguntei:

- Então Hugo, qual o problema?
- Eu não sei Felipe, eu tenho me sentido perdido nestes últimos dias! Eu não sei qual vai ser o meu futuro e eu estou com medo... eu não sei, eu não tenho nenhum familiar vivo, Finnel é tudo o que me sobrou...
- Mas as pessoas de Finnel são sua família agora, não precisa ter medo, nós vamos conseguir nos livrar da ameaça de Conde Rafael! Por que você não veio conversar comigo antes? Ou melhor, por que não conversou com o Raul sobre isso?
- Felipe, o Raul tem pouquíssima habilidade de entender as outras pessoas e eu não consigo conversar sobre os meus sentimentos com ele, além disso, eu estou confuso, eu não sei o que fazer da minha vida! Eu não amo o Raul... ele é uma ótima pessoa e eu realmente não queria ter feito isso com ele... e nem com você! Eu peço desculpas pela confusão que eu causei! Eu acho que eu só estou procurando um pouco de compreensão, carinho, eu não sei... você e o Bernardo são as minhas únicas referências sobre esse assunto, eu acho que foi por isso que, bem... você sabe...
- Bem, eu acho que compreendo... Mas eu achei que estava tudo bem entre você e o Raul! Não sabia que você não amava ele!
- Bem, como eu disse, ele é uma ótima pessoa, mas eu acho que preciso de mais! O Raul foi o meu primeiro porto seguro quando eu entrei nesse grupo, por isso eu me envolvi com ele! Eu acho que estava procurando a princípio um pouco de segurança, mas eu preciso de alguém que possa me oferecer algo a mais além de sexo e segurança!
- Err... Bem, eu entendo o que você quer dizer Hugo, mas o modo como você agiu foi a pior forma de sair desse relacionamento! Se você aceitar um conselho, eu diria que, da próxima vez, você deveria falar com a outra pessoa e explicar o que você está sentindo!
- Eu aceito o seu conselho Felipe, e... eu peço desculpas novamente pelo modo como eu agi!
- Bem, agora está tudo acabado mesmo! Apenas não faça isso novamente, ok? Principalmente a parte de flertar com o Bernardo!

Neste exato momento, em que eu e Hugo tínhamos resolvido as nossas pendências, uma pessoa nos aborda gritando:

- Corram! É o William, ele está ferido!

Imediatamente, eu comecei a seguir a pessoa que me dera a notícia e em minha mente eu imaginava o que poderia ter acontecido com o meu irmão. Eu havia o identificado como tal há pouquíssimo tempo e realmente gostava da ideia de ter um irmão mais velho, portanto eu não estava pronto para perdê-lo.