Eu saí correndo pelas vielas do vilarejo, desejando desesperadamente encontrar Bernardo e, ao mesmo tempo, com medo da reação dele. Eu o encontrei na praça central do vilarejo, onde ele estava conversando, de costas para mim, exaltadamente com Raul, em meio às diversas outras pessoas que estavam nas missões de mapeamento. Eu andei devagar, mas decidido a falar com ele. O meu coração batia acelerado e as minhas mãos estavam úmidas de suor, pois eu não queria ser acusado de algo que eu não fiz no meio de outras tantas pessoas. Porém, para minha surpresa, quando eu toquei no ombro de Bernardo, este se virou em minha direção, agarrou-me em seu colo e me beijou apaixonadamente. Eu estava confuso, mas não me importei em apenas deixar aquele momento acontecer. Quando senti que estava preparado, eu disse:
- Meu amor, aquilo que você viu... Eu não estava lhe traindo... O Hugo...
- Eu sei, eu sei! Calma meu amor!
- Como assim você sabe?
- Eu sei que você não faria isso comigo! Eu confio em você!
- Mas por que você correu de mim então?
- Felipe... por mais tranquilo que eu possa parecer, eu posso ficar bastante agressivo em certas situações e... bem, alguém tentando beijar o meu marido com certeza é uma dessas situações, então eu preferi vir aqui informar ao Raul que ele precisa tomar conta do namorado dele, antes que eu o agrida!
- Sério?! Meu amor, isso é tão bom! Você confia mesmo em mim!
- É claro! Não seja bobo! Eu nunca mais desconfiarei de você depois do erro desastroso que eu cometi na situação com o William há alguns meses! Bem, eu quase lhe perdi... Eu não quero me afastar de você ou lhe julgar sem que você tenha uma chance de se explicar! Além disso, tem mais uma coisa...
- O que meu amor?
- O Hugo também tentou algo comigo alguns dias antes de eu sair para a minha missão e eu o adverti para que ele parasse com aquilo imediatamente e fosse fiel ao Raul, de modo que eu não comentaria nada com ninguém... Bem, pelo visto ele não conseguiu, certo?
- Mas que atrevido! Eu vou ensinar uma lição para ele agora mesmo!
- Não meu amor! O Raul acabou de sair daqui e acho que eles têm muito o que discutir! O que você acha de nós darmos uma volta pelo vilarejo? Eu estou louvo para ouvir o que aconteceu por aqui na minha ausência e também quero lhe contar o que ocorreu na minha missão!
- Claro meu amor! Vamos fazer isso!
Nós andamos pelas vielas, nas quais nós encontramos várias pessoas que estavam revendo os seus entes queridos e comemoravam o fato de todos estarem bem. Eu contei a Bernardo que as coisas tinham transcorrido com tranquilidade no vilarejo e a maioria das atividades tinham sido mantidas normalmente. Em contrapartida, ele me contou o que acontecera desde que ele saíra de Finnel:
- Bem, nós alcançamos um pequeno vilarejo o anoitecer do dia em que o meu grupo saiu de Finnel. Como nós não tínhamos certeza sobre a fidelidade dos habitantes, nós apenas nos alojamos na casa de um ancião que parecia ser o líder. Na manhã seguinte, nós nos separamos e investigamos discretamente a opinião dos diversos habitantes sobre Conde Rafael. No final do segundo dia, nós concluímos que o vilarejo estava submetido à influência de do seu tio, mas eles não estavam satisfeitos com isso, então nós decidimos conversar com o homem em cuja casa nós estávamos hospedados, a fim de oferecer uma parceria com Finnel para que o vilarejo pudesse se libertar da influência de Conde Rafael, o que foi muito bem recebido e aceito. Assim, no terceiro dia, o ancião convocou uma reunião na praça da cidade e convocou todos os habitantes, de modo a compartilhar a ideia e verificar a opinião deles sobre a união com Finnel. Infelizmente, algumas pessoas alegaram fidelidade a Conde Rafael, as quais foram neutralizadas e trazidas conosco para cá. Porém, a maioria acatou a ideia de se unirem ao nosso vilarejo, então nós temos outro aliado agora! Eu informei que as pessoas que se interessarem em treinamento de batalha podem vir a Finnel para serem treinado por nós, então provavelmente algumas pessoas chegarão nos próximos dias.
- Isso é incrível Bernardo! Bem, então eu acho que a finalização das outras casas que nós estávamos construindo aconteceu bem a tempo, eu acho!
- Com certeza! Essas pessoas vão precisar de um lugar para ficar! Mas, mudando de assunto, eu senti muito a sua falta! Eu queria ter voltado antes, mas nós passamos todo o terceiro dia acertando os termos da aliança entre os dois vilarejos! Mas eu parti no final da tarde do terceiro dia, para poder chegar hoje de manhã aqui! Viajar à noite não é o ideal, mas os outros entenderam que eu precisava lhe ver e foram bastante compreensivos.
- Eu também senti muito a sua falta meu amor! Bem, então você deve estar cansado! Vamos para casa, eu acho que o Raul e o Hugo não estão mais lá!
Nós caminhamos de volta para a nossa casa, onde nós de fato não encontramos Raul ou Hugo. Bernardo apenas deitou em nossa cama e adormeceu. Como eu tinha acabado de acordar, eu não me juntei a ele. Enquanto ele permaneceu dormindo em nossa casa, eu fui falar Raul, por motivos pessoais e também relativos à missão dele. Eu me dirigi à casa dele, na qual eu fui recebido surpreendentemente bem por ele:
- Olá Felipe! Pode entrar!
- Você não parece bem mestre!
- Faz algum tempo que você deixou de ser meu discípulo! De fato, é você quem tem me ensinado coisas atualmente.
- Você sempre vai ser meu mestre! Afinal, eu não estaria aqui sem o que você me ensinou! Não só as estratégias de batalha, mas também como ser mais forte e decidido!
- Eu fico lisonjeado! Agora pare de me bajular e diga o que você quer!
- Aí está! Agora sim, esse é o meu mestre! Insultos para dar e vender! Eu vim aqui perguntar se você precisa conversar com alguém sobre a missão ou... bem, sobre o que mais quiseres!
Para me surpreender ainda mais, eu presenciei Raul, aquele que me ensinou a ser forte e evitar demonstrar minhas fraquezas, começar a chorar. Ele se sentou e eu o acompanhei, sem saber o que fazer, até que ele falou:
- Eu não entendo Felipe... O que eu tenho de errado? Por que as pessoas fogem de mim?
- Raul, eu não sei sobre errado, mas eu posso ser sincero sobre uma coisa?
- Claro! Fique à vontade!
- As pessoas podem ficar um pouco intimidadas pelo modo como você trata tudo com tanto rigor! Uma relação é um pouco mais complexa do que uma estratégia de batalha! Não há, de maneira alguma, um jeito de você planejar isso! De fato, você apenas vive e faz o seu melhor para que isso funcione! Mas um pouco de flexibilidade é sempre útil!
- Então você está dizendo que o Hugo me traiu porque eu não sou flexível?
- Eu não sei o porquê do Hugo ter agido dessa forma! Só estou apontando algo que eu percebi sobre você Raul! Quem sabe o que está se passando na cabeça dele, né?
- Eu não sei o que dizer... Eu sou assim...
- Eu não estou sugerindo que você mude qualquer coisa! Apenas estou apontando uma percepção minha e lhe dando um conselho e amigo, totalmente com boas intenções!
- Obrigado Felipe! Fico feliz em saber que você me considera um amigo!
- Você salvou a minha vida Raul! Não há nada que eu possa fazer que vá retribuir o suficiente o que você fez naquele dia! Eu vou te abraçar agora e não quero ser rejeitado, ok?
Raul aceitou o meu abraço e o retribuiu, apesar de estar visivelmente desconfortável com a situação. Em seguida, eu o indaguei sobre a missão:
- Mudando de assunto, com foi a missão? Boas notícias vindas do Leste?
- Bem, eu acho que sim... Olha, os habitantes do vilarejo são todos pacifistas, então não estão do lado de Conde Rafael, o que é uma boa notícia, porém também não querem se juntar a nós em uma luta contra ele. Entretanto, eu estabeleci com eles uma aliança comercial, para que nós possamos comercializar produtos! Bem, nós tecnicamente temos aliados no leste, já que eles pelo menos estão dispostos a estabelecer algum tipo de relação com o nosso vilarejo. De qualquer forma, eu ofereci abrigo a qualquer pessoa que se interesse por batalhas, mas não queira envolver o seu vilarejo nisso, ou seja, qualquer deles que seja um guerreiro pode se juntar a Finnel como morador.
- Isso é ótimo Raul! Essas são realmente ótimas notícias! Nós precisamos de todo e qualquer tipo de apoio na nossa jornada! Além disso, Finnel tem prosperado bastante na produção de vários produtos, então acho que essa aliança seria uma boa forma de arrecadar mais fundos para armas.
- Bem, essa foi a minha jornada. Agora precisamos esperar pelos outros dois grupos, para que nós possamos analisar os resultados e planejar os nossos próximos passos!
- Exato! Bem, eu acho que você está cansado Raul, então eu vou te deixar descansar! Qualquer coisa, não hesite em me procurar na minha casa!
- Tudo bem, obrigado... discípulo!
- De nada, mestre!
Depois que eu saí da casa de Raul, eu caminhei em direção à praça central do vilarejo, porém fui interceptado por Hugo em uma das ruas, o qual indagou:
- Felipe, eu posso falar com você?
- Hugo, eu realmente não quero conversar com você agora!
- Mas eu preciso apenas te dizer uma coisa...
- Tudo bem, então diz enquanto nós caminhamos, porque eu não tenho tempo para perder com você!
- Felipe, eu gosto mesmo de você!
Eu não consegui reagir tão bem àquilo como eu gostaria, já que eu, em um impulso, empurrei com um braço o peito de Hugo contra a parede de uma casa e pus meu outro braço sob o queixo dele, dizendo:
- Qual é o seu problema? Se você gosta mesmo de mim, então por que também flertou com o meu marido há alguns dias? Você muda tão rápido assim de sentimento ou só tem problemas mesmo?
Para a minha surpresa, ele começou a chorar copiosamente e disse entre soluços:
- Eu não sei!
Ao ver o sofrimento nos olhos dele, eu o soltei e, desconcertado, indaguei:
- Como assim?
- Eu não sei qual o meu problema!
- Eu peço desculpas pelo que acabou de acontecer Hugo! Você está com algum problema? Quer conversar?
- Sim...
- Vem, vamos até a praça! Lá nós podemos sentar e conversar melhor.
Nós caminhamos até a praça e nos sentamos em frente a uma estátua recém construída, a qual era um símbolo da nossa luta e uma homenagem às pessoas que morreram por causa do ódio de Conde Rafael contra os homossexuais, a qual consistia em dois homens, duas mulheres e um casal heterossexual de mãos dadas. Quando nos sentamos, Hugo havia parado de chorar, então eu perguntei:
- Então Hugo, qual o problema?
- Eu não sei Felipe, eu tenho me sentido perdido nestes últimos dias! Eu não sei qual vai ser o meu futuro e eu estou com medo... eu não sei, eu não tenho nenhum familiar vivo, Finnel é tudo o que me sobrou...
- Mas as pessoas de Finnel são sua família agora, não precisa ter medo, nós vamos conseguir nos livrar da ameaça de Conde Rafael! Por que você não veio conversar comigo antes? Ou melhor, por que não conversou com o Raul sobre isso?
- Felipe, o Raul tem pouquíssima habilidade de entender as outras pessoas e eu não consigo conversar sobre os meus sentimentos com ele, além disso, eu estou confuso, eu não sei o que fazer da minha vida! Eu não amo o Raul... ele é uma ótima pessoa e eu realmente não queria ter feito isso com ele... e nem com você! Eu peço desculpas pela confusão que eu causei! Eu acho que eu só estou procurando um pouco de compreensão, carinho, eu não sei... você e o Bernardo são as minhas únicas referências sobre esse assunto, eu acho que foi por isso que, bem... você sabe...
- Bem, eu acho que compreendo... Mas eu achei que estava tudo bem entre você e o Raul! Não sabia que você não amava ele!
- Bem, como eu disse, ele é uma ótima pessoa, mas eu acho que preciso de mais! O Raul foi o meu primeiro porto seguro quando eu entrei nesse grupo, por isso eu me envolvi com ele! Eu acho que estava procurando a princípio um pouco de segurança, mas eu preciso de alguém que possa me oferecer algo a mais além de sexo e segurança!
- Err... Bem, eu entendo o que você quer dizer Hugo, mas o modo como você agiu foi a pior forma de sair desse relacionamento! Se você aceitar um conselho, eu diria que, da próxima vez, você deveria falar com a outra pessoa e explicar o que você está sentindo!
- Eu aceito o seu conselho Felipe, e... eu peço desculpas novamente pelo modo como eu agi!
- Bem, agora está tudo acabado mesmo! Apenas não faça isso novamente, ok? Principalmente a parte de flertar com o Bernardo!
Neste exato momento, em que eu e Hugo tínhamos resolvido as nossas pendências, uma pessoa nos aborda gritando:
- Corram! É o William, ele está ferido!
Imediatamente, eu comecei a seguir a pessoa que me dera a notícia e em minha mente eu imaginava o que poderia ter acontecido com o meu irmão. Eu havia o identificado como tal há pouquíssimo tempo e realmente gostava da ideia de ter um irmão mais velho, portanto eu não estava pronto para perdê-lo.
http://ogmaron.blogspot.com.br/2014/09/amor-colorido.html
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