- Inicialmente, é necessário dizer
que esta foi uma decisão difícil e não-unânime...
- Não! Não é justo! – gritou Hugo,
em meio à multidão.
- Companheiro Hugo, por favor,
deixe-me terminar de informar a decisão.
- Pedimos desculpas, ele só está muito
nervoso. Pode prosseguir conselheiro! Certo Hugo?
- Sim, eu peço desculpas...
pode continuar...
- Obrigado! Continuando, esta decisão
é controversa, porém representa a opinião da maioria dos conselheiros. Peço a todos
os presentes que se comprometam a respeitar a decisão de... bem... conceder anistia
ao acusado... – neste momento, várias pessoas na multidão começam a gritar em desaprovação,
mas são prontamente contidas pelo porta-voz - ATENÇÃO! Como eu disse anteriormente,
sabemos que esta é uma decisão controversa, mas pedimos que confiem na decisão
dos vossos conselheiros e, para aqueles que ainda tiverem problemas com esta
decisão, estaremos abertos para ouvi-los a seguir. Entretanto, gostaríamos de
ressaltar alguns pontos importantes acerca desta decisão: quanto ao irmão mais
novo, visto que não teve participação direta no que ocorreu em Pasine e por se
tratar meramente de uma criança, não será realizado julgamento, embora ambos não
estão livres para partir, de modo que devem permanecer em Arlyston sob supervisão
direta do conselheiro Felipe, o qual foi nomeado como guardião dos dois a
partir de agora. Caso algum dos dois tente sair do vilarejo sem supervisão, os
demais moradores estão autorizados a tomar as medidas necessárias. O acusado
está em período probatório por prazo indeterminado, de modo que deve provar o
seu valor ao povo de Arlyston, contribuindo ativamente para o bem do vilarejo.
Caso, seja apanhado em qualquer atividade que prejudique o vilarejo ou não
contribua da mesma forma que os outros, este conselho fará nova avaliação para
reavaliar a decisão de anistia. Por fim, o acusado está obrigado a se desculpar
pessoalmente com as famílias de cada pessoa que foi afetada pelas suas ações.
Caso Rafael II e o conselheiro Felipe estejam de acordo com essas condições, podemos
dar por encerrada a deliberação deste caso e iniciar o período probatório, no
qual o ex-visconde deve tentar se integrar a este vilarejo e tentar se redimir
dos seus erros.
- Eu aceito estes termos e admiro
a objetividade do conselho nesta decisão – prontamente respondi – responsabilizo-me
pelos cuidados de Rafael II e Davi, fazendo o possível para que se integrem ao
nosso vilarejo e sejam dignos da misericórdia que estão demonstrando para com
eles.
- Muito bem, que assim seja –
respondeu o porta-voz – Tragam Rafael II! – ordenou ele. Assim que o meu primo
saiu à rua, a multidão iniciou novamente a gritar – SILÊNCIO! Repito que,
qualquer pessoa que esteja descontente com a decisão pode conversar conosco a
seguir. Por ora, vamos confirmar se o acusado aceita os nossos termos, em cujo
caso será escoltado até o alojamento do conselheiro Felipe. Então, o que tem a
dizer em relação ao que foi decidido? – finalizou ele, dirigindo-se a Rafael.
- Eu... bem... – podia-se ver
que pronunciar aquelas palavras estava a ser uma tortura para ele – Eu agradeço
a oportunidade... vou fazer tudo... tudo para provar que me deixar viver não foi
um erro...
- Sendo assim, dou por encerrado
este veredito e peço que todos voltem às suas atividades. Como eu disse, quem não
se sentiu representado por esta decisão pode vir conversar com o conselho agora
– Assim, a multidão dispersou-se, embora muitas das pessoas estivessem
visivelmente incomodadas e descontentes.
- Então eu acho que podemos ir –
disse eu, depois que a multidão havia se dispersado, dirigindo-me a Rafael, o
qual estava sendo contido por dois conselheiros.
- Rafael! – disse Hugo, abraçando-o
– Ainda bem que, no fim, deu tudo certo!
- Podes parar com... –
respondeu Rafael, corado, visivelmente desconfortável e tentando se desvencilhar
de Hugo – isso... sabes que eu não gosto...
- Bem, pois pode começar a se
acostumar – respondeu Hugo, determinado – Boa parte da mudança que precisa ocorrer
contigo diz respeito a te aceitares! És um de nós agora e aqui nós demonstramos
afeto sempre que nos apetece!
- Sim... é que...
- Nem adianta, este aqui quando
põe algo na cabeça, é extremamente persistente!
- Sou mesmo! – confirmou Hugo -
Agora vamos andando, afinal, com certeza, precisas urgentemente descansar! No
momento estás com uma aparência péssima, que não faz jus à tua beleza!
- Está bem! Está bem! Desde que
pares com estas coisas de abraços e elogios – respondeu Rafael, visivelmente
desconcertado – Será que podem me levar de uma vez ao alojamento... por...
favor? – finalizou ele, dirigindo-se aos conselheiros, os quais assentiram e começaram
a conduzi-lo, enquanto eu me mantive um pouco atrás, junto com Hugo.
- Bem, parece que as mudanças já
começaram – disse eu, sussurrando e rindo – Já até ouvimos um “por...favor?”
- Espero que sim – respondeu Hugo
em um tom mais sério – Sabes tanto quanto eu que ele ainda não está fora de
perigo e, com aquele temperamento, não sei se ele conseguirá mostrar que mudou...
e se eles voltarem atrás na decisão? E se...
- Calma – pus minhas mãos nos
ombros dele – Te importas de verdade com ele, não é? Dá para perceber!
- Sim! Como eu disse, que sei
que ele foi parte de coisas horríveis... que ele te torturou... e eu sinto
muito! Mas eu sei que ele não é tão mau quanto parece!
- Eu também já comecei a perceber
isso, embora não possa perdoá-lo completamente por ora...
- Eu imagino...
- Mas não se engane, eu realmente
espero que isso dê certo! Afinal, ele é meu primo! A única diferença entre ele
e eu é que o meu pai não era um monstro! Olha, eu vou fazer de tudo para que
ele consiga se integrar aqui e tentarei convencer o conselho a manter a decisão,
mas vou precisar da tua ajuda para ter certeza de que Rafael vai fazer a parte dele.
- Quanto a isso, pode ficar
tranquilo, pois eu estarei todos os dias de olho nele! Fazendo de tudo para que
a adaptação seja mais fácil!
- Eu tenho certeza de que sim! – neste
momento os conselheiros, que estavam logo à frente, chegaram ao meu alojamento,
então eu finalizei – Eu fico muito feliz de ver o quanto crescestes
emocionalmente Hugo, a ponto de poderes ajudar outra pessoa que também está
perdida a encontrar o próprio caminho! – dito isso, dirigi-me aos conselheiros –
Eu assumo daqui. Muito obrigado! – Assim que conduzi Rafael para dentro do
alojamento, Davi veio ao nosso encontro e abraçou o irmão, enquanto Tomás e
William expressaram com olhar grande surpresa e confusão.
- Irmão! É tão bom te
ver de novo! Eu pensei que eles fossem...
-
Está tudo bem agora, eu acho… - respondeu Rafael, olhando para mim.
- Ótimo! Quando
podemos ir para casa?
- Bem, quanto a isso... Davi,
esta é sua a nova casa! O conselho aceitou libertar o Rafael, com a condição de
que os dois fiquem aqui em Arlyston... não, se preocupe, pois ninguém os fará
mal, isto eu garanto! Mas vocês precisarão executar tarefas, assim como todos
neste vilarejo!
- Mas eu nunca fiz
nenhuma tarefa... e se não gostarem e quiserem me punir!
- Ninguém vai te punir
Davi! Além disso, não se preocupe, pois nós vamos ajudar!
- Prometem?!
- É claro! Nós gostamos
muito de você e vamos fazer de tudo para que consiga se sentir em casa aqui!
- Exato! Nós vamos
cuidar de você! Isso é uma promessa! E assim que eu estiver melhor eu prometo
que vamos te levar para ver as partes mais bonitas do vilarejo!
- Eu gostaria muito!
Obrigado Tomás!
-
Claro, porque aqui todos vivem felizes para sempre… – resmungou Rafael.
-
E… quase! – respondeu Hugo – Quase ficamos uma conversa inteira sem comentários…bem,
comentários como só você sabe fazer! – Finalizou ele rindo – Eu peço desculpas,
ele ainda é um trabalho em andamento!
- Bem, eu vou dar crédito
a ele por ter ficado tanto tempo sem fazer os seus comentários, mas realmente a
atitude precisa melhorar! De fato, nós aqui em Arlyston, ultimamente, não temos
trabalhado com a perspectiva de “felizes para sempre”, pois, como você mesmo
sabe, os nossos entes queridos podem desparecer de nossas vidas de uma hora
para outra. Mas temos tentado trabalhar com a perspectiva de fazer tudo uns
pelos outros e tentar tirar o melhor do tempo que temos com aqueles que amamos.
Talvez essa seja a maior lição que podes aprender conosco e nós... bem... eu,
pelo menos, estou disposto a recomeçar do zero e te ajudar no que for possível.
Mas eu preciso que estejas disposto a trilhar esse caminho junto comigo.
-
Bem…
- Não precisa responder
agora, até porque eu preciso ir ver o Bernardo. Mas pensa sobre isso! E digo
mais, caso você melhore a sua atitude, eu não vou ser o único a te oferecer
ajuda! Aqui em Arlyston, assim como na antiga Finnel, nós estamos abertos a
receber todos aqueles que estejam de coração aberto para fazer parte da nossa
família – dito isso, eu saí e direção ao local onde estava Bernardo, com o
coração um pouco mais leve, por ter momentaneamente resolvido o problema do
julgamento de Rafael. Agora, o que eu mais queria era finalmente ter Bernardo
nos meus braços, sem pressa... apenas nós dois...depois de tanto tempo.